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DIVERSIDADE CULTURAL: PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL




Mário de Andrade e o Movimento Modernista

Mário de Andrade realizou ao longo da década de 1920 viagens pelo Brasil fotografando paisagens, estilos arquitetônicos e a diversidade dos perfis das populações das cidades históricas mineiras, amazônicas e nordestinas. O objetivo de Mario de Andrade era registrar o contexto sociocultural, valorizando as manifestações artisticas e culturais do país por meio do reconhecimento dos traços definidores da identidade nacional.
A fase do movimento de que Mário participou estabeleceu uma missão primordial: o “abrasileiramento” de todas as esferas da arte. Nesse contexto as manifestações brasileiras deveriam ter como inspiração a riqueza cultural nacional, sendo assim, os modernistas buscavam uma arte singular perante o restante do globo.

Semana de 22

Promovida por diversos intelectuais e tendo como idealizadores do movimento Mário de Andrade e Oswald de Andrade. Esse encontro estabeleceu-se como o principiante de reação à importação de movimentos artísticos e mesmo teorias científicas estrangeiras.
Em 1928, Oswald de Andrade criou o termo antropofagia, as influências externas seriam “devoradas e vomitadas”, criando daí um produto totalmente novo. Desse modo, a atitude modernista poderia, sim, ser adotada e se manifestar em todas as regiões do Brasil, dando maiores destaques pelos modernistas a cultura ameríndia e africana.
O objetivo central da Semana de 22 foi atingindo com a introdução de um nativismo moderno em contraponto ao academicismo vigente nas artes e nas letras nacionais, o qual deixava de fora vários artistas, muitas obras e públicos menos favorecidos.

Governo Vargas

A ascensão de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, trouxe novos desdobramentos no contexto do movimento cultural: Vargas pretendia prolongar seu mandato, incentivando a articulação do nacionalismo às questões de identidade, buscando a construção de um novo Brasil. Intelectuais foram inseridos nos quadros funcionais dos órgãos governamentais, dedicados a pensar escrever e debater a nacionalidade que se buscava consolidar, bem como implantar ações e criar instituições e legislação específica. O governo getulista por essas razões é um referencial para a educação patrimonial.

Proposta de Mário de Andrade – patrimônio histórico e cultural brasileiro

Mário de Andrade foi defensor de um conceito abrangente de patrimônio, articulando em um mesmo eixo as dimensões materiais e imateriais. O patrimônio deveria ser considerado um complexo formado por elementos tangíveis, bens móveis, físicos e imóveis; intangíveis, conhecimento popular, manifestações, língua, folclore, etc.
A proposta de Mário de Andrade não foi bem aceita, provocando rejeição da proposta. O principal resultado foi o privilégio dado aos bens materiais (somente na passagem do século XX para o XXI é que ocorreria a valorização dos bens imateriais).
Mário de Andrade foi fundador e primeiro diretor do Departamento de Cultura do município de São Paulo, no qual implantou a Sociedade de Etnologia e Folclore, o Coral Paulistano e a Discoteca Pública Municipal. O objetivo era de, a partir da capital paulista, formar o país por meio da cultura.
O Ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanema, convidou Mário de Andrade para o trabalho de elaboração de um projeto de lei nacional que regulamentasse o preceito constitucional de proteção do patrimônio histórico do país. A proposta de Mário de Andrade – valorização de aspectos diversos da cultura nacional, como imigrantes e demais raças formadoras da identidade nacional – viria a divergir daquele que estava em processo do governo getulista: o apagamento das diferenças em prol de um Estado despolitizado. Diversidades culturais poderiam evidenciar diferenças políticas, como o anarquismo dos imigrantes italianos. A derrota da proposta de Mário de Andrade resultou em uma seqüela sentida até hoje pelos brasileiros, no que tange diversidade cultural.
A doutrina totalitária estabeleceu o Decreto-Lei de 1937. Foi organizada a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional mediante a atuação do IPHAN, tratando apenas dos bens móveis e imóveis relacionados à história brasileira.

Decreto-Lei n. 25/1937

Desconsideraram de seu escopo questões culturais relacionadas aos indígenas e aos negros, bem como às culturas operárias. O destaque ficou por conta da monumentalidade arquitetônica ligada às atividades econômicas da elite proprietária, valorizando a paisagem colonial, barroca, de tradição luso-brasileira.
Um dos eixos ideológicos do Estado Novo foi à criação e promoção de uma identidade brasileira homogênea, para tanto, faziam-se necessárias a supressão das diferenças étnicas e culturais e a ocultação de conflitos sócias e políticos. A ênfase recaia às edificações militares, prédios públicos, religiosos, do período colonial e século XIX.
O tombamento foi um dos principais instrumentos para a proteção do patrimônio histórico, por meio do qual o Estado adquiriu poder para declarar tombados bens culturais públicos e os pertencentes a particulares, no caso de estes apresentarem valor significativo para a coletividade. O Decreto-Lei 25/1937 é o mais importante mecanismo vigente de salvaguarda do patrimônio cultural nacional.
Todo ato humano é político, e não podemos ignorar o fato que, no começo, a política pública de patrimônio do Brasil protegeu menos as manifestações populares. Em primeiro lugar, porque talvez se acreditasse que fossem dotadas de longa permanência no tempo e, assim pudessem aguardar o melhor momento para que ações governamentais voltassem suas atenções para elas; em segundo lugar, porque o patrimônio imaterial exige outro tipo de instrumento jurídico para a sua preservação que não o tombamento.

Carta de Atenas

A Carta de Atenas, de 1931, é o primeiro documento internacional elaborado para orientar a proteção do patrimônio e os processos de restauração de bens edificados. Promovida pelo Escritório Internacional dos Museus da Liga das Nações e elaborada durante o Primeiro Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos em Monumentos, a Carta de Atenas ou Carta de Restauro de Atenas, emergiu de um contexto bélico mundial e a perspectiva era mobilizar a humanidade em prol de objetivos coletivos, como a valorização de locais de patrimônio que sensibilizassem a todos os povos e países. A carta recomendava ainda que as nações criassem ou fortalecessem órgãos próprios voltados à preservação e restauro e destacava a importância de promover ações educativas de sensibilização e divulgação do interesse de salvaguarda dos testemunhos históricos presentes nas cidades na condição de bens edificados.

Monumento

Todo monumento é um documento, compreendido como produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças que aí detinham o poder. Todo documento deve ser analisado pelos profissionais que hoje se dedicam ao estudo do passado, como testemunhos de uma intenção, sejam eles textuais, visuais, audiovisuais, etc. Portanto, ultrapassando o conceito positivista de documento, prova histórica textual que age de forma neutra, os documentos não são obras do acaso, mas frutos das forças políticas, jogos de poder.
A presença dos monumentos vai além de servir como orientação em meio à teia urbana e representa um vinculo ao mesmo tempo mais amplo e profundo, entre a arte e o viver em cidades, ultrapassando a afirmação de Mário de Andrade de que os monumentos atuam como estorvo aos cidadãos e à municipalidade.
A problemática em torno dos monumentos, compreendidos aqui como documentos, ou seja, como registros internacionais de uma construção social e política de seu tempo e como matéria-prima da memória, permite-nos olhar com maior cuidado para os bens materiais e imateriais que se inscrevem no cotidiano. A educação patrimonial é uma das mais interessantes maneiras de promover esse olhar crítico sobre a história e a memória, tendo como balizas os significados políticos e culturais da preservação do patrimônio.
O objetivo dessa trajetória iniciada nos chamados tempos heróicos da política patrimonial, e sustentada até a atualidade, é demonstrar a dependência entre dois elementos: preservação e valorização dos bens tombados e construção de novos significados socioculturais do patrimônio como um todo, mediante a criação de uma política pública com fortalecimento doa direitos culturais.

Lugares de memória

A expressão lugares de memória, diz respeito à valorização da transitoriedade veloz do presente no lugar da preservação das tradições do passado. Existe uma diferença entre história diária, decurso dos acontecimentos, e a memória, matéria-prima para os estudos do passado. Lugares de memórias são entendidos como museus, arquivos, coleções, cemitérios, monumentos, santuários etc. Neles o que se expõem são formas passadas que não têm mais influência ou representatividade no presente, pois se transformaram em redutos artificiais da memória, não demonstrando nitidamente a relação entre vivência e experiência e se restringindo a um determinado uso.
É justamente pela necessidade das sociedades contemporâneas manterem tais espaços, mesmo que atualmente enfraquecidas, que se reconhece a necessidade de aperfeiçoamento. Ampliar os lugares de memória para além das fronteiras de coleção, arquivo e guarda, inserindo-os no cotidiano como parte da dinâmica das sociedades.
Somente uma ritualização cultural em museus, arquivos etc., que conheça e aceite o passado com todas as suas contradições pode ser uma atitude libertadora; ou seja, o patrimônio também deve ser entendido como resultado de processos de luta material entre grupos sociais e entre temporalidades diferentes.
Os museus são peças fundamentais, uma vez que atuam como mediadores culturais e são um ótimo instrumento para aferir a qualidade da educação patrimonial desenvolvida na sociedade brasileira, pois nesses ambientes controlados por regras de visitação que se desenvolvem ações amplas para a articulação entre presente e passado. Um fator da cisão entre cultura visual e a cultura escrita é que: em países com altas taxas de analfabetismo, fez com que referências visuais do passado fossem registradas por escrito por uma elite alfabetizada.    

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